Apenas três profissionais da corporação dominam a Língua Brasileira de Sinais, enquanto a cidade tem cerca de 25 mil pessoas com deficiência auditiva.
A guarda municipal Girlei Marconi é uma das três profissionais da corporação em Ribeirão Preto (SP), dentre os 263 guardas, aptas a se comunicar em Libras, a Língua Brasileira de Sinais. Por outro lado, a cidade tem aproximadamente 25 mil pessoas com deficiência auditiva.
A falta de profissionais capacitados para atender essa população pode gerar riscos e dificultar a comunicação em situações de emergência, como acidentes, ocorrências de violência e atendimentos médicos ou em delegacias.
O problema ficou evidente na tarde de quarta-feira (13), quando Rafael Russo, homem com deficiência auditiva, foi atacado por um cachorro de grande porte em um posto de combustíveis da Vila Tibério, zona oeste de Ribeirão Preto.
Imagens de câmera de segurança registraram o momento em que o cão mordeu o braço de Rafael enquanto o tutor, um homem em situação de rua, tentava se aproximar (veja imagem abaixo).
A vítima caiu, conseguiu se levantar, mas o animal voltou a atacá-la. Desorientado e sem conseguir se comunicar verbalmente, Rafael pediu ajuda a uma viatura da GCM, que rapidamente chamou a guarda Marconi.
Ela atua há quase 10 anos na GCM de Ribeirão Preto e se tornou referência em atendimentos inclusivos.
“Ele estava muito assustado, porque a falta de comunicação apavora. Primeiro fiz o acolhimento: falei para ele se acalmar, que estava tudo bem e que eu iria acompanhá-lo.
Ele me contou que o dono do cão chegou já batendo nele, ele tentou dizer que era surdo, ficou assustado, mas agora está bem. Com a minha intermediação, tudo se resolveu”.
Com a interpretação em Libras, a vítima conseguiu explicar o ocorrido e receber os primeiros cuidados, evitando complicações maiores.
Do interesse escolar à carreira na GCM
A habilidade de Girlei com Libras começou em 2017, quando trabalhava em uma escola e percebeu que uma aluna, Maria Eduarda, de 9 anos, não interagia com os colegas. Ao descobrir que a criança era surda, decidiu aprender a língua de sinais para se comunicar com ela.
Desde então, fez pós-graduação em Libras e aplica o conhecimento diariamente em atendimentos a vítimas de violência doméstica, acidentes de trânsito e outras emergências.
“Conheci a Maria Eduarda, que por coincidência faz aniversário no mesmo dia que eu. Notei que ela não se aproximava para conversar como as outras crianças. Perguntei a um porteiro o motivo. E ele me disse que ela era surda. Eu pensei: ‘Quero falar com ela, conhecer esse mundo também”.
O trabalho da guarda vai além da simples interpretação. Girlei já auxiliou mulheres vítimas de agressão, vítimas acidentadas, clientes de banco que precisavam de atendimento acessível e pessoas que enfrentavam dificuldades em hospitais e delegacias.
“Não sou fluente, mesmo porque não tenho familiares surdos, mas eles são muito carinhosos. Quando chego, digo: ‘Calma, vamos conversar, me ajuda’, e eles também me ajudam, porque sabem que estou ali para apoiar. É uma troca”.
Para a guarda, utilizar Libras em atendimentos é mais do que um recurso técnico, é uma questão de cidadania.
“Eles nasceram aqui, são ribeirãopretanos e têm direito a acesso à saúde, educação e segurança. A segurança pública também passa pela comunicação”.
Fonte: G1