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Carlos Santana Júnior nasceu com Síndrome de Usher, doença genética que prejudica o sistema auditivo e a visão. Ele ficou cego aos 20 anos, mas não perdeu o amor pelo clube do Morumbi, acompanhando as partidas por um ‘campo tátil’ confeccionado pelo amigo Hélio Fonseca.

Torcedor surdocego do São Paulo, Carlos Alberto Santana Junior, de 34 anos, emocionou mais uma vez a torcida tricolor paulista ao vibrar com o fim do jejum de títulos do Morumbi após a vitória diante do Palmeiras na final do Campeonato Paulista de 2021 neste domingo (23).

O vídeo de Carlos assistindo à final ao lado do guia-intérprete de Libras Hélio Fonseca viralizou nas redes sociais. Na gravação, Hélio – que é corintiano – narra os lances da partida final ao amigo através de um campinho sensorial feito especialmente para o rapaz.

“Foi o primeiro título que ele presenciou do São Paulo desde quando ficou completamente cego. Foi uma partida emocionante e significativa pra ele porque, desde o início da pandemia, ele andava bastante triste. Por causa do coronavírus, tem tido cada vez menos contato com pessoas fora da família e teve que adiar o casamento. O São Paulo é das poucas alegrias no dia a dia dele”, afirmou Hélio.

Carlos Junior e Hélio Fonseca são amigos há vários anos e dessa amizade nasceu a ideia de criar um campo tátil para que o são-paulino fanático pudesse acompanhar as partidas do time do coração.

“Vi essa ideia de um outro torcedor do Santos, que também é surdocego, e a esposa usa o campo tátil para descrever a trajetória da bola. Na Copa de 2014, reproduzi isso e coloquei outros elementos em 2018 pra que ele pudesse saber mais detalhes da partida. Além da trajetória da bola, o equipamento permite que ele saiba o nome do jogador, quem fez a jogada e como foi o gol”, conta Fonseca.

Neste domingo de final do Campeonato Paulista, os dois tinham combinado de ver a partida juntos. Porém, por causa de uma internação da mãe, Hélio se atrasou e chegou à casa do amigo apenas no segundo tempo.

“Quando cheguei, a partida já estava 1 a zero. Ele estava acompanhando pelos sites, através da acessibilidade, mas pediu que eu descrevesse pra ele como tinha sido o primeiro gol, porque queria sentir a emoção e saber os detalhes”, conta o tradutor.

“Após o fim da partida, ele contou que foi uma das maiores alegrias dele nos últimos tempos. E eu fico muito feliz de ter podido proporcionar essa emoção, não só por causa da pandemia e a amizade, mas por poder colocar a minha profissão em prática de verdade e ajudar quem realmente precisa”, completa Hélio.

Síndrome de Usher
‘Carlinhos’, como é conhecido pela família, nasceu com Síndrome de Usher, doença genética que prejudica o sistema auditivo e pode influenciar a visão. Ele nasceu surdo e foi ficando gradativamente cego, até perder totalmente a visão por volta dos 22 anos.

Carlinhos com o jogador Hernanes durante visita ao CT do São Paulo, em 2019

Apesar disso, não perdeu o amor pelo São Paulo e ganhou o coração dos torcedores tricolores em 2019, após um outro vídeo dos dois amigos ganhar as redes durante a semifinal do Paulistão, contra o mesmo Palmeiras.

A vibração de Carlinhos contagiou pela primeira vez a torcida e levou o fanático torcedor ao coração do time do Morumbi. Por convite da diretoria do clube, ele foi conhecer pessoalmente o elenco tricolor daquela época.

Aquela partida da semifinal terminou com a vitória do time do Morumbi por 5 x 4 nos pênaltis. Mas, na final, o time comandado por Cuca naquele ano perdeu a final para o Corinthians por 2 x1, em partida final disputada na Neo Química Arena, em Itaquera, na Zona Leste.

Carlinhos e o jogador Pato (ex-São Paulo) durante a visita de 2019 ao CT do clube

“Para ele foi um acontecimento fantástico. Porque ele mesmo sempre me diz que as pessoas passam a existir na vida dele quando ele toca nelas. E ter podido tocar nos jogadores, no técnico, foi a realização e materialização de um sonho que o Carlinhos tinha desde pequeno”, lembra Hélio, que acompanhou aquela visita ao lado do amigo.

O título adiado em 2019 foi extravasado por Carlinhos neste domingo (23), após a conquista que o time do São Paulo não comemorava desde 2005.

“O futebol e o São Paulo são as maiores alegrias dele, especialmente nesse período de pandemia. Várias vezes ele comentou comigo que, por causa do coronavírus, diminuiu muito o contato com o mundo exterior, por causa do medo das pessoas com o toque, que é essencial pro surdocego dialogar com outros grupos. Após a visita de 2019, a gente tinha planos de ir mais pro estádio, mas a pandemia não deixou. E o título do São Paulo devolveu pra ele a alegria daquelas dias”, conta o guia-intérprete.

Amigos que inspiram
A história de Hélio Fonseca com a língua de sinais nasceu aos 8 anos, quando ele aprendeu o idioma para brincar com um vizinho. Desde então, fez amizades com outros jovens na mesma situação e resolver fazer disso profissão e modo de vida.

Hélio Fonseca e Carlos Santana Júnior, amigos de longa data, graças a língua de sinais

“Em 2002, quando a língua de sinais ganhou status de idioma, pensei que era uma oportunidade de fazer disso uma profissão. Pra mim já era um prazer poder falar com os amigos surdos e cegos, por quê não fazer disso um modo de vida?”, conta o rapaz.

Hélio fez uma faculdade e é guia-intérprete, trabalhando com língua de sinais e acessibilidade na TV Cultura de São Paulo, emissora do governo paulista.

“’Narrar’ o jogo pro Carlinhos e ver a empolgação dele é a coroação de uma profissão que escolhi pra viver. Quando vejo ele vibrando e entendendo todas aquelas técnicas que aprimorei nos estudos é uma alegria pra nós dois. Pra mim porque vejo que optei pela profissão certa e pra ele porque está entendendo tudo e podendo acessar o mundo melhor, com paixão e muita alegria”, afirma o amigo.

Fonte: G1

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