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Situação aconteceu em Curitiba; a Anvisa reconhece importância de máscaras inclusivas e orienta que elas sejam fabricadas de modo que fiquem justas no rosto.

Em uma das idas ao supermercado em Curitiba junto com a esposa, Alisson Fernandes dos Santos, de 43 anos, foi impedido de entrar no local porque usava uma máscara de proteção transparente feita de plástico PETG. Alisson é surdo, e este modelo de máscara permite a leitura labial.

“Me sinto excluído”, afirmou Alisson, que é doutor em bioquímica.

A situação aconteceu em 13 de agosto e foi contada ao G1 pelo Alisson e pela esposa dele, a professora Aline Gonçalves dos Santos, de 39 anos.

“Logo na entrada, fomos em direção à medição de temperatura que eles fazem e já veio o segurança imediatamente, nos barrou na entrada e falou que não podia entrar com aquela máscara”, disse Aline.

Aline também usava a máscara de plástico, pois, auxilia na comunicação dela com o marido.

Máscara inclusiva é feita de plástico PETG

Alisson não fala a Língua Brasileira de Sinais (Libras), portanto, depende da leitura labial. Aline explicou isso ao segurança e ainda falou que se tratava de uma máscara inclusiva.

O segurança alegou, segundo o casal, que esse tipo de máscara não fazia a contenção da saliva.

O casal disse que a estrutura da máscara é fechada tanto na lateral quanto nas partes superior e inferior. Como ela é transparente, fica mais difícil perceber que tem essas barreiras.

De acordo com Aline, o segurança os levou até a bancada onde há um cartaz sinalizando quais máscaras são permitidas. Ela voltou a dizer que Alisson é surdo, mas o segurança não permitiu a entrada deles.

“Nem ofereceram uma alternativa, de repente chamar outra pessoa para conversar ou pedir para um funcionário acompanhar. Nada. Simplesmente assim: ‘não vão entrar'”, contou Aline.

O caso aconteceu no Angeloni Supermercado, na unidade do Bigorrilho. O G1 entrou em contato com o estabelecimento para comentar o assunto, mas, não teve retorno até a publicação desta reportagem.

Segurança da máscara
Alisson e Aline têm usado essa máscara sempre – inclusive em outros supermercados e estabelecimentos comerciais e também para trabalhar.

Aline e Alisson contaram ter sido barrados de supermercado de Curitiba por usarem essa máscara de plástico

“Ele trabalha com essa máscara em um hospital de referência, que atende pacientes da Covid. Quer dizer, essa máscara oferece proteção. Se não oferecesse, ele já seria um dos contaminados”, disse Aline.

Segundo o fabricante da máscara usada por Alisson, ela é segura e inclusiva. O uso deve ser pessoal, e a máscara precisa ser higienizada a cada três horas.

O plástico PETG, ainda conforme o fabricante, é um material mais resistente que o acrílico de uso geral e mais flexível.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) reconhece importância de máscaras inclusivas e orienta que elas sejam fabricadas de modo que fiquem ajustadas ao rosto, sem espaços nas laterais ou nas margens.

Conforme a Anvisa, não existem normas técnicas ou recomendações de fabricação e eficiência para o modelo de máscaras inclusivas.

A indicação da Anvisa é para que a produção dessas máscaras siga as orientações adotadas para confecção das máscaras de tecido, com adaptações que permitam a leitura labial do usuário e sem comprometer a segurança.

Inclusão
Curitiba tem 1.933.105 habitantes, segundo dados de agosto de 2019 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Desse total, 3.621 pessoas não conseguem ouvir de modo algum, conforme o último Censo do IBGE. Outras 13.757 têm grande dificuldade na audição, e ainda há 61.806 com alguma dificuldade.

A questão da inclusão dos surdos é algo que vai além da pandemia. Alisson exemplificou com o fato de os estabelecimentos não terem um intérprete de Libras, para os surdos que se comunicam dessa maneira. A maioria dos surdos fala Libras.

Além disso, Alisson contou que geralmente as pessoas não param o que estão fazendo para se comunicar com um surdo, o que dificulta e até impossibilita a compreensão.

“Sou surdo, então pare para falar comigo. Olhe para mim, eu preciso te ver. Fale mais devagar”, explicou Alisson.

Desconhecimento

Daiane é professora e vice-coordenadora do curso de Letras-Libras da UFPR

Para a vice-coordenadora da graduação do curso de Letras-Libras da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Daiane Ferreira, essa situação revela um “desconhecimento global” e que precisa ser revisado.

“O que aconteceu foi completamente equivocado. É um absurdo”, afirmou Daiane.

Daiane também é surda e defende a disseminação da Libras. Segundo a professora, apenas a oralização dos surdos é um impeditivo para a autonomia deles.

“É um pedido de socorro: que a sociedade aprenda Libras”, disse.

Assim como as pessoas aprendem línguas estrangeiras – como inglês e espanhol –, por que não aprender Libras? Esse é o questionamento reflexivo da professora.

“Pouquíssimas pessoas falam Libras e, quando sabem, é de um jeito precário. Sabe dar oi, ou algo muito básico”, explicou.

Daiane ressaltou que surdos são consumidores. Então, se o estabelecimento não tem funcionários que falem Libras, o atendimento é prejudicado.

“Com comunicação, você assegura a satisfação do cliente surdo”, afirmou.

Desde 2002, a Libras é reconhecida como meio legal de comunicação e expressão. A lei federal nº 10.436 prevê o apoio ao uso e à difusão da Libras como meio de comunicação das comunidades surdas do Brasil, além de atendimento e tratamento adequados para pessoas surdas.

Conheça a Lei nº 10.436
Contudo, a aplicação da lei não parece ser recorrente.

“A pessoa surda vive nessa situação complicada”, afirmou Daiane.

Fonte: G1

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