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Legendagem, legendagem descritiva, audiodescrição e Língua Brasileira de Sinais (Libras) devem estar presentes nas obras audiovisuais incentivadas pelo governo federal. Os recursos beneficiam pessoas com deficiência, que somam quase um quarto da população.

A democratização do acesso à Cultura é uma premissa da atuação do Ministério da Cidadania. E para que ela seja de fato acessível, deve incorporar recursos de acessibilidade, garantindo igualdade de oportunidades à população com deficiência. No caso do audiovisual, obras brasileiras fomentadas com recursos públicos federais devem seguir uma determinação: a inclusão de recursos de legendagem, legendagem descritiva, audiodescrição e Língua Brasileira de Sinais (Libras). Desde 2014, mais de 1.780 obras audiovisuais voltadas ao cinema e à televisão tiveram a obrigação de oferecer recursos de acessibilidade, o que representa cerca de 470 mil minutos de conteúdo.

“Eu pude assistir as histórias em libras e compreender muito melhor. É preciso ampliar isso”, afirma Brenda Cristanes, após participar de festival voltado a deficientes auditivos. Na foto, ele faz o símbolo em Libras para a expressão “Eu te amo”

Em 2018, a estudante do 9º ano Brenda Cristanes Costa Silva, de 19 anos, foi pela primeira vez a uma sessão de cinema com acessibilidade. Ela foi convidada a ir, junto à sua classe, à Mostra Cine Surdo, realizada em Brasília (DF). A experiência foi transformadora: “Eu só vou em cinema em passeios da escola e com os amigos surdos, mas a maioria dos filmes são apenas legendados para ouvintes. Dessa vez, eu pude assistir as histórias em libras e compreender muito melhor. É preciso ampliar isso.”

Na primeira edição da mostra, foram realizadas 24 sessões, com 12 filmes nacionais que haviam sido recém-lançados no circuito exibidor nacional. Todos os filmes apresentavam legendas descritivas e, após cada sessão, foi promovido um debate com especialista, com tradução em Libras. “Eu considerei o evento tão importante, tivemos pessoas surdas que disseram ter encontrado a sua vocação ali. Quantas vezes eu já vi pessoas que diziam: ah, queria assistir tal filme, mas não tem legenda. Ah, queria ver tal filme, se tivesse audiodescrição eu compreenderia melhor. Então, é muito importante que os filmes venham com esses recursos e que os cinemas também tenham uma estrutura para recebê-los”, afirmou a produtora do evento, Bárbara Barbosa, especialista em Acessibilidade em Ambientes Culturais.

A produção do evento chegou a oferecer a legendagem para cinco filmes da mostra que ainda não contavam com o recurso. Foi o caso de Menina de Barro, produzido a partir de um financiamento coletivo e sem recursos iniciais para a inclusão das ferramentas de acessibilidade. “Eu não tinha me dado conta do quanto o filme podia alcançar esse público, porque de fato, a princípio, não visamos esse público com deficiência auditiva. E atinge, porque essa é uma realidade deles também, o bullying. Então, foi fantástico, foi uma das melhores sessões que a gente teve”, comentou o diretor do filme, Vinícius Machado.

Menina de Barro recebeu recursos de acessibilidade foi exibido para pessoas com deficiência auditiva. O resultado foi positivo tanto para espectadores, quando para a direção do filme

Menina de Barro conta a história da jovem superdotada Diana, que entre outras coisas precisa lidar com problemas de família e com o bullying na escola – o filme foi premiado como Melhor longa-metragem (Júri Popular) no 50º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O diretor comentou que a experiência com os deficientes auditivos abriu seus olhos e ouvidos a outro mundo, mais inclusivo: “A partir de agora, é sempre pensar no que a gente pode agregar no filme para poder atingir públicos diversificados. Não tem como não ser mais assim. O mundo está pedindo para que a gente olhe para a diversidade, olhe para o diferente e tente incluir o máximo possível.”

O ministro da Cidadania, Osmar Terra, afirma que, entre as prioridades da pasta, está o atendimento às pessoas com deficiência, que somam quase 24% da população brasileira, segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010). “Garantir que as pessoas com deficiência tenham acesso à Cultura e possam se divertir assistindo a um filme no cinema é uma das prioridades desta gestão”, destaca Terra. O secretário especial da Cultura do Ministério da Cidadania, Henrique Pires, reforça o compromisso: “A gente está tentando, cada vez mais, utilizar os novos equipamentos, as novas ferramentas, para que todas as pessoas estejam mais inseridas no mundo da Cultura”.

Acessibilidade é a norma
Para incrementar a política pública audiovisual, o Ministério da Cidadania conta com a Agência Nacional do Cinema (Ancine), entidade responsável pelo fomento, regulação e fiscalização do mercado do cinema e do audiovisual no Brasil. É da Ancine a Instrução Normativa (IN) nº 116, publicada em dezembro de 2014, que obriga a inclusão de recursos de acessibilidade nas cópias das obras audiovisuais fomentadas com recursos públicos federais.

Na prática, a IN 116 prevê que todos os projetos apresentados à agência que utilizem recursos de fomento indireto (renúncia fiscal) ou do Prêmio Adicional de Renda devem incluir os recursos de legendagem, legendagem descritiva, audiodescrição e Libras. Esta medida, sozinha, garante que praticamente a totalidade do conteúdo audiovisual brasileiro voltado ao segmento de exibição cinematográfica conte com os recursos de acessibilidade. Além disso, desde 2015, a Ancine inclui em editais que empregam recursos do Fundo Setorial do Audiovisual um comando análogo à instrução normativa, prevendo a inclusão da acessibilidade.

Vale dizer que outra instrução normativa da agência, a IN nº 128, publicada em 16 de setembro de 2016, estabeleceu normas voltadas à promoção da acessibilidade, desta vez aos distribuidores e exibidores cinematográficos (saiba mais). Essas duas medidas, portanto, abarcam a cadeia produtiva do audiovisual – começando pelos produtores, passando pelos distribuidores e chegando aos exibidores – no tocante à acessibilidade.

De forma mais global, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/15), em vigor desde janeiro de 2016, aponta que as pessoas com deficiência têm direito à cultura, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, sendo garantido o acesso aos bens culturais em formatos acessíveis. A norma se alinha à Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Brasil em 2007. Um dos pontos da convenção que se destacam é que o documento indica que a deficiência não diz respeito somente ao indivíduo, mas relaciona as barreiras e a interação das pessoas com deficiência com o ambiente. Esse novo olhar sobre a deficiência fundamenta uma série de desdobramentos e novos conceitos. No caso do audiovisual, portanto, o Ministério da Cidadania prevê a inclusão da acessibilidade em todo o caminho a ser percorrido pelo filme.

Um guia para produções acessíveis
Além da Ancine, a Secretaria do Audiovisual (SAv) da Secretaria Especial da Cultura também apoia e fomenta o setor. Além da formação, regionalização, difusão não comercial, democratização e preservação, a produção inclusiva também integra as competências da SAv. Nesse sentido, a secretaria disponibiliza (em português e inglês) o Guia para Produções Audiovisuais Acessíveis. O documento apresenta parâmetros para os recursos de acessibilidade de audiodescrição, legendas para surdos e ensurdecidos (LSE) e janela de Libras.

A partir da publicação, produtores, diretores, críticos e demais interessados podem aplicar ou mesmo avaliar os recursos em produções audiovisuais seguindo um padrão de qualidade que de fato atende à comunidade de pessoas com deficiência visual e auditiva. “É importante que se tenha em mente que um recurso de acessibilidade bem empregado faz com que a produção audiovisual chegue às pessoas com deficiência com qualidade e possa ser experimentada com prazer, entretenimento, crítica”, afirma a assessora técnica em Acessibilidade do Audiovisual da SAv, Sylvia Bahiense. “Um recurso bem empregado traz à tona a apreciação e discussão da obra, e não do recurso em si. A audiodescrição, a LSE e a janela de Libras exigem profissionais gabaritados, sensíveis à arte, pois são responsáveis por garantir uma experiência estética aos usuários”, completa.

Sylvia explica que a aplicação dos recursos de acessibilidade exige uma dedicação especialmente focada nas pessoas com deficiência: “O guia resolve, e resolve definitivamente, como é que você faz uma legenda para surdos, por exemplo. E quando eu falo como é que se faz uma legenda, não é que a gente não sabe como se faz uma legenda. É que o tempo de leitura de um surdo não é o nosso tempo de leitura. Porque o surdo aprende a ler, pode ser oralizado, mas tem o tempo muito menor de leitura”. A assessora esclarece que todas as orientações incluídas no guia foram testadas por pessoas com deficiência. “Nós fizemos uma tabela que foi totalmente testada, esse guia foi testado em vários lugares. A gente passava o filme e depois fazia um questionário para entender como a pessoa apreciou aquele filme. Fizemos um estudo detalhado de cada item”, informa.

Segundo Sylvia, a aplicação dos recursos de acessibilidade, orientada na publicação, ainda “movimenta o mercado audiovisual”. “Isso é uma coisa que vai dar um grande impulso no mercado cultural. Por exemplo, não se pode colocar uma pessoa para fazer uma legenda específica apenas transcrevendo o que está sendo falado; já entendemos que a transcrição não dá tempo de leitura. Você tem que enxugar, você tem que saber muito bem a sua língua. Então, só isso já mobiliza um profissional, exige uma pessoa que estude isso”, defende. O guia aborda as especificidades de todas as modalidades de tradução audiovisual acessível. Conheça as modalidades:

Audiodescrição
A audiodescrição é uma modalidade de tradução audiovisual, de natureza intersemiótica, que visa a tornar uma produção audiovisual acessível às pessoas com deficiência visual. Trata-se de uma locução adicional roteirizada que descreve as ações, a linguagem corporal, os estados emocionais, a ambientação, os figurinos e a caracterização dos personagens.

Janela de Interpretação de Língua de Sinais
É o espaço destinado à tradução entre uma língua de sinais e outra língua oral ou entre duas línguas de sinais, feita por tradutor e intérprete de Língua de Sinais, na qual o conteúdo de uma produção audiovisual é traduzido num quadro reservado, preferencialmente, no canto inferior esquerdo da tela, exibido simultaneamente à programação.

Legendagem para surdos e ensurdecidos (LSE)
É a tradução das falas de uma produção audiovisual em forma de texto escrito, podendo ocorrer entre duas línguas orais, entre uma língua oral e outra de sinais ou dentro da mesma língua. Por ser voltada, prioritariamente, ao público surdo e ensurdecido, a identificação de personagens e efeitos sonoros deve ser feita sempre que necessário.

Fonte: http://cultura.gov.br/acessibilidade-e-norma-em-filmes-fomentados-com-recursos-publicos-federais/

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