Unidades de saúde em Alagoas iniciaram cursos em Libras para capacitar médicos e equipes no atendimento de um público formado por 140 mil pessoas.
O atendimento médico às pessoas com surdez em Alagoas mostra o que os hospitais públicos do estado ainda não trazem serviços adaptados para atender adequadamente os deficientes auditivos. Os relatos de pessoas surdas consultadas pelo OP9 são unânimes sobre a forma como os atendimentos acontecem. Ou por que eles não ocorrem. Nenhum deficiente auditivo conheceu ao longo da vida um médico que soubesse a Língua Brasileira de Sinais (Libras). O máximo encontrado foi o funcionário da recepção ou algum enfermeiro que mal sabia o básico da língua, insuficiente para um atendimento adequado.
A Lei nº 10.436, do dia 24 de abril de 2002, estabelece “que as instituições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequados aos surdos”. Não foi o que o OP9 constatou entrando em contato com as principais redes de saúde pública de Alagoas.
Em resposta, alguns citaram até que não têm muita demanda de pacientes surdos nas unidades. No entanto, a Central de Intérpretes da Secretaria de Direitos Humanos e da Mulher aponta que em Alagoas existem mais de 140 mil deficientes auditivos. Evidente que todos passíveis de atendimento médico. Outras unidades demonstraram que não têm o atendimento desejável, mas estão dando passos para isso.
Helvio Alto
O Hospital Helvio Alto, referência em doenças infectocontagiosa, possui de três a quatro profissionais que têm domínio da Língua Brasileira de Sinais (Libras), informou a assessoria de imprensa. Nenhum deles é médico. A assessoria informou que não tem conhecimento de enfermeiros fluentes na língua. Os profissionais que têm conhecimento são fisioterapeutas ou terapeutas ocupacionais do Núcleo de Reabilitação, que são acionados quando surge algum paciente surdo durante o plantão.
Segundo a assessoria, caso estes profissionais não estejam presentes no momento da consulta à pessoa com surdez, os profissionais utilizam um aplicativo chamado Hand Talk. A ferramenta é caracterizada por um boneco que traduz em Libras o que o ouvinte fala. A unidade de saúde afirmou também que surgem muitos pacientes com deficiência auditiva que não conhecem de Libras, desta forma, a comunicação se dá por gestos.
Hospital Universitário
O Hospital Universitário respondeu que atualmente não existe programa específico para facilitar a comunicação entre população surda em Alagoas. Afirmou, no entanto, que há um projeto para tornar obrigatório o conhecimento da língua de sinais pelos cerca de 2.000 profissionais que trabalham na unidade de saúde. O projeto, inicialmente, prevê a implantação de curso de Libras para profissionais que trabalham diretamente no setor de atendimento. O programa está previsto para ser implantado em 2019, ainda sem data. A assessoria informou que falta definir a metodologia do ensino para que o curso atinja a todos os profissionais.
Hospital de Emergência Daniel Houly
O Hospital de Emergência do Agreste, localizado em Arapiraca, afirmou que um curso de formação em Libras para médicos, enfermeiros e pacientes iria ser iniciado no dia 19 de dezembro de 2018. No entanto, o prazo precisou ser prorrogado, sem data definida, porque, segundo a assessoria, a equipe que faria o treinamento precisou realizar uma viagem para o Recife. O curso tem o objetivo de capacitar médicos e enfermeiros. Na primeira etapa, o treinamento alcançaria 100 profissionais e na segunda a mesma quantidade. Atualmente, o hospital não possui atendimento adaptado, como intérprete ou profissionais com domínio de Libras.
Maternidade Santa Mônica
A Maternidade Santa Mônica informou que não tem serviço específico de modo a facilitar a comunicação entre a população surda e seus profissionais de saúde. Logo após, emitiu uma nota, informando que a unidade “tem profissionais capacitados com curso de Libras e, no surgimento de uma gestante grávida, esses profissionais são acionados pela equipe da recepção ou do serviço social”. Entretanto não soube informar quantos e quais tipos de profissionais têm conhecimento da língua. A maternidade informou, por meio de assessoria que, das vezes que uma paciente surda apareceu na unidade, ela estava com acompanhante. O OP9 pediu o contato de algum médico que soubesse Libras para que falasse com a reportagem, mas a assessoria não informou nenhum.
Pam Salgadinho
A Secretaria Municipal de Saúde (SMS), responsável pela administração do Hospital Pam Salgadinho, afirmou que ofereceu em 2018, por meio de parceria com a Escola de Governo, a capacitação em Libras para profissionais de algumas unidades. “Está tramitando um processo para capacitar profissionais de toda a rede da SMS. O processo está caminhando e a previsão é que comece a ser ofertado a partir de 2019”, informou a unidade em nota.
No momento, o Centro Especializado de Reabilitação (cer 3), localizado no PAM Salgadinho, oferece a pacientes surdos terapias fonoaudiólogas e consultas. “Quando não vem acompanhado, temos a sensibilidade de fazer algum gesto ou leitura labial. A gente faz o que pode e sabe que tem que tratar bem. São pessoas que precisam de um tratamento diferenciado. As vezes eles vêm um pouco agitados e a gente tem que ter paciência para acalmá-los. Quando não ocorre com perfeição, a gente aciona alguém do Cer”, disse Alba Valéria do Nascimento, diretora administrativa do Pam Salgadinho.
Hospital Geral do Estado
O Hospital Geral do Estado (HGE) afirmou que a atual gestão tem se preocupado com um melhor acolhimento ao público com surdez e, para isso, já “vem fomentando a ideia de promover um curso fechado para os profissionais que fazem o primeiro atendimento. Salientando que o hospital orienta os profissionais a participarem dos cursos de libras promovidos pela Escola de Governo ou Associação dos Amigos e Pais de Pessoas Especiais (APPE), ficando a escolha deles optarem ou não por participar”, informou em nota.
Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu)
O Samu informou que há uma enfermeira e uma técnica de enfermagem com formação em Libras e que já atenderam pessoas surdas. Segundo a assessoria do órgão, elas são acionadas quando há um paciente dessa natureza, mas não trabalham exclusivamente para atendê-los. Afirmou que o Samu já disponibilizou de um curso de Libras em 2018, mas somente dois profissionais concluíram.
A psicóloga bilíngue do Instinto Bilíngue de Qualificação e Referência em Surdez (Ires), Aline Trindade Pinho e Silva, explica que uma das principais dificuldades encontradas pelos surdos que chegam à entidade é a da área médica, principalmente infectocontagiosa. Segundo ela, as informações são difíceis de chegar à comunidade surda, e por isso, esses pacientes acabam desistindo do tratamento porque não entendem de maneira clara o problema.
Governo estadual dispõe de uma Central de Intérprete de Libras, a CIL
São cerca de 120 surdos atendidos por mês pela Central de Intérprete de Libras (CIL), coordenada pela Secretaria Estadual dos Direitos Humanos e da Mulher, do Governo Estadual. Na Central trabalham três profissionais, responsáveis por acompanhar pacientes com deficiência auditiva ou surdo-cegueira.
Os acompanhamentos ocorrem durante consultas médicas, solicitação de documentos pessoais, cadastramento dos programas sociais do governo, consulta sobre a situação de benefícios, atendimentos jurídicos e apoio na realização de denúncias por meio de canais como o Disque 100. Os atendimentos com intérpretes só são disponíveis para órgãos públicos que não dispõem de intérpretes e nem profissionais que saibam Libras.
A CIL conta também com atendimento espontâneo e interno. Os surdos vão para fazer agendamentos e/ou tirar dúvidas sobre diversos assuntos e realizar atendimentos como ligação para marcar consultas, agendar ida ao INSS e outros órgãos que necessitem de ligação ou marcação via internet.
Também realizam agendamento para datas posteriores em diversos lugares, como: hospital, delegacia, fórum, Juizado, INSS, Bolsa Família, SMTT, Consultas medicas, Posto de Saúde, Defensoria Pública, Secretarias de Assistência Social, Saúde, Educação, Detran, Ministério Público, diversas lojas para fazer cartão, Câmara de Vereadores, Assembleia Legislativa, entre outros.
Para acessar os serviços, o usuário deve fazer um agendamento pelo número 3315-2132, através de um familiar, de forma presencial ou através do e-mail cil.alagoas@gmail.com. A CIL atualmente está localizada na Rua Dr. Augusto Cardoso, no bairro da Jatiúca.
Fonte: https://www.op9.com.br/al/noticias/hospitais-publicos-ainda-tem-pouca-estrutura-para-pacientes-com-surdez/